terça-feira, 20 de abril de 2010

Na pele de quem tem TDAH

Continuando com a honra de termos convidados especiais, envio o texto do médico neurologista Roger Soares Taussig. Em seu blog (link ao final do texto), Dr. Roger escreveu um texto extremamente coerente e interessante sobre um problema muito comum hoje em dia dentro da sala de aula: O TDAH. Boa leitura a todos!
Professora Célia Alves Cardoso


************************************************************

NA PELE DE QUEM TEM TDAH

Numa sala de aula com 20 crianças basta um Joãozinho inquieto e hiperativo para botar fogo na classe e deixar os cabelos da professora brancos como neve. Apesar de engraçado nas anedotas, o menino que pula, trepa, sobe e agita, mesmo sem querer, causa transtornos para os que dividem com ele o dia-a-dia e para si mesmo também. Lembro de um garoto cujo apelido era "foguetinho"! Imagine o desespero de professores, diretores de escola, bedéis e da mãe para lidar com o foguetinho. Na década de 80 não se falava em TDAH e o menino era tido apenas como mal-educado ou endiabrado. Mas enquanto todo mundo quer apagar o pavio do foguetinho com medicações e terapias, poucos se preocupam em ver como ele se sente por dentro.


O Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) parece ter aumentado, em termos de prevalência, nas últimas décadas. Em parte pela clarificação dos critérios diagnósticos e também pela difusão de informação a respeito da condição, pela internet e redes sociais, que aumentaram o reconhecimento do problema. Mas, além do aumento da detecção, parece estar havendo um real aumento na incidência da patologia, seja pela exposição das crianças a uma enxurrada de estímulos sensoriais cotidianamente ou pela falta da atuação dos pais no estabelecimento de limites para os cérebros em desenvolvimento.

A presença de alguém que desmonta a estrutura social causa um desconforto nos outros que, naturalmente, reagem, tentando submeter e enquadrar o subversivo. Em consequência, são muitas idas à sala da diretora, muitas anotações e reprovações, além de alguns convites para procurar um outro lugar para estudar. Tudo isso causa terríveis impactos sobre quem sofre com o TDAH.

Compreender melhor o problema pelo ponto de vista de quem o carrega pode nos ajudar a acolher bem quem precisa de apoio. Vamos agora explorar um pouco o universo de quem porta essa condição, comparando a visão externa que se tem dele com os efeitos dessa visão sobre ele.

As críticas frequentes(sem atitudes que realmente ajudem) minam a autoestima da criança acometida com TDAH e geram grande frustração. Mesmo tendo um desejo genuíno de se enquadrar e ser bem recebido, a hiperatividade impede que o garoto ou garota ajam como queriam. O resultado é uma sensação de deseperança, já que por mais que se esforce, nunca consegue chegar à altura das expectativas que se impõem sobre ele.

Uma vez que os professores se cansem de tentar "ajustar" aquela criança impossível, passam a recorrer a punições que se traduzem, de modo geral, como atos de ostracismo. São os castigos no intervalo, as tarefas na biblioteca longe do resto da classe ou as horas passadas sentado na sala da diretora. A tradução disso, no mundo mental do portador de TDAH, é um sentimento de abandono e de exclusão. Uma vez convencido de que ele não se enquadra e nunca vai ser bom o suficiente para aquela sociedade, o indivíduo deixa também de se importar e se acomoda à margem... vira um marginal. Até um terço dos portadores de TDAH abandonam a escola antes de completarem o ensindo médio. Também o uso de drogas é aumentado nesse grupo e pode ser prevenido com o tratamento adequado durante a infância.

Paradoxalmente ao péssimo desempenho nas atividades escolares, boa parte das crianças com TDAH têm uma inteligência acima da média. Alguns são mesmo portadores de altas capacidades, como se denominam, tecnicamente, os pequenos gênios. Mas mesmo com grande rapidez de raciocínio(por isso alguns são tão encantadores e engraçados), não conseguem produzir resultados no nível de suas habilidades. Em inglês, diz-se que são "underachievers". Alcançam menos do que poderiam. A condição de underachiever é vista desde fora, mas tem também sua contrapartida interna.

Tendo a intuição de suas próprias capacidades e percebendo que nunca atingem seu nível potencial, os portadores de TDAH tendem a se sentirem incompletos. Têm a sensação de estarem devendo sempre para si mesmos, para os outros e para o mundo. A ansiedade que apresentam pode ser uma tradução dessa infelicidade interna. E tem mais...

Cerca de um quarto das crianças com TDAH têm o que se denomina de comportamento oposicional-desafiador. Esse comprometimento social parece ser próprio da doença e não apenas uma consequência de sua inadaptação ao meio. Pessoas com esse problema têm, entre outras coisas, dificuldade de perceber como o outro se sente e precisam ser treinados para se colocar no lugar do outro. Para os adultos, são apenas desobedientes e mal-educados e merecem mais punições, pois só assim "aprenderão". Acontece que não se deve punir uma criança por uma atitude não-intencional. Isso é uma coisa que poucos educadores percebem.

Dificuldades em se relacionar com figuras de autoridade e de perceber o que os outros sentem, leva as pessoas hiperativas a se sentirem frequentemente injustiçadas. Afinal, para elas o que falta é compreensão por parte dos outros. Mesmo os que se controlam e se adaptam, ao serem perguntados revelam que muitas vezes têm vontade de dizer não, só para contradizerem uma instrução ou comando e têm que lutar contra isso constantemente, para não sofrerem mais ainda.

Para finalizar, vejamos a questão do hiperfoco, outro sintoma típico do transtorno de déficit de atenção e hiperatividade. As crianças com TDAH têm dificuldade em recrutar sua própria atenção e de manter a concentração, para elas é um tormento terem que se esforçar em uma atividade continuada e desinteressante, por isso evitam fazer suas tarefas. Mas embora tenham dificuldade de gerar atenção, em alguns momentos relacionados a muito estresse, apresentam grande capacidade de concentração e manifestam todo seu potencial adormecido. A isso se chama de hiperfoco.

Na prática, vemos as crianças e adolescentes com TDAH deixarem as coisas sempre para a última hora, pois só assim atingirão o grau de estresse suficiente para desencadear o estado de hiperfoco que lhes permite realizar as tarefas. Interiormente, tentam várias vezes começar a fazer suas obrigações mas não conseguem, adicionando um pouco mais de ansiedade com a passagem do tempo. Em resumo, têm um sofrimento crescente com grande ansiedade até que conseguem atingir o nível de estresse do hiperfoco e fazer seus deveres. O pior é que depois de completarem a tarefa, sentem-se aliviados e esquecem de colocar na bolsa para entregar para a professora no dia seguinte. Essa condição acompanha o indivíduo desde a infância e se estende pela adolescência e vida adulta, dando o tom de suas relações de trabalho e afetivas.

Cuidar de quem tem TDAH exige empenho, amor e desejo sincero de ultrapassar os limites. O apoio de profissionais competentes e a realização de um pacto entre pais, educadores e profissionais da saúde mental é imprescindível para que esses indivíduos especiais se desenvolvam e contribuam, com sua maneira única, à sociedade. Afinal, por não ficarem presos dentro da caixa, são capazes de grandes insights criativos e podem enriquecer o ambiente em que se encontram. Não dá pra apagar o pavio do foguetinho, temos apenas que apontá-lo para a direção certa.

por Roger Taussig Soares http://estadoneurologico.blogspot.com/

Que crianças deixaremos para essa Terra?

Acho que nos perguntamos muitas vezes: Que Terra deixaremos para as crianças? Mas será que a pergunta não deveria ser ao contrário? Que crianças estamos preparando para cuidar desse planeta?
Por coincidência, li duas reportagens sobre o mesmo tema: Uma na Revista Veja desta semana e outra através de um email de minha prima em Portugal.
Apesar de todas as diferenças culturais que nos separam da "santa terrinha", pude perceber que os professores enfrentam os mesmos problemas cá e lá.
A questão da superproteção dos pais, a falta de limites das crianças... Se antes a criança "não tinha escolhas", agora "ela escolhe tudo". E nesse "tudo" pode-se incluir os passeios que os pais terão que fazer com elas, o restaurante em que irão, o que querem aprender ou não, o que querem vestir, etc.
Acho que caimos no extremo oposto do que vivenciamos quando crianças. Do "nada pode" ao "tudo pode", não conseguimos encontrar um equilíbrio.
O resultado da nossa educação "nada pode": Insegurança, timidez, dificuldade de expressar suas vontades... Mas também: boa educação, respeito aos mais velhos, respeito às hierarquias.
O resultado da educação "tudo pode": Manha, falta de limites, falta de educação e de respeito, falta de valor aos bens públicos e até mesmo aos privados, indisciplina na escola e por aí afora. Tentei pensar nos aspectos positivos, mas ainda não os encontrei. Se souberem de algum, me falem, por favor!
Precisamos repensar nosso modo de agir. Será que sempre temos oportunidade de fazer "o que queremos"? Estamos preparando crianças para o mundo que os espera? Será que a proteção dos pais é uma boa armadura para lidar com situações reais?
Deixo aqui minha preocupação e minhas dúvidas. Vamos traçar novos caminhos juntos?

Carinhosamente,
Professora Célia Alves Cardoso

quinta-feira, 15 de abril de 2010

Convidada do Mês - Cinthya Rachel

A convite do blog Professoras Fundamentais, Cinthya Rachel escreveu esta pequena história. Parece ficção... mas acreditem, é pura realidade!
Inspirem-se! Comentem! Desabafem!



Entre seus principais trabalhos estão: Castelo Rá-Tim-Bum(Biba); Turma da Cultura (apresentadora) e comerciais do suco Tang.

Atualmente escreve livros infantis.

Talk

Estava em uma festa dia desses com uma menina de 13 anos ao meu lado, ela estava falando que curtia meu estilo, o jeito que eu me vestia, meus acessórios (oi, presilha de pena de pavão?), que ela também gostava de usar coisas diferentes, que ninguém mais usava, começou a falar da escola, das amigas e lembrei de quando eu tinha a idade dela, de como era ter 13 anos, de como era a década de 90, de 80 e contei um pouco pra ela.

Falei do vinil, da TV que você tinha que girar um botão pra mudar de canal, que não existia TV à cabo, computador pessoal, quiçá internet. Contei como a gente fazia trabalho de escola, que ia na biblioteca, fazia pesquisa, copiava tudo na folha de papel almaço (quem lembra?). Quando olho tem uma penca de meninos da mesma idade dela, todos ao me redor e fazendo várias perguntas, foi dífícil pra eles entenderem o conceito do telefone de disco (como assim a "gente" tinha tempo pra esperar o disco voltar?), da fita cassete, do VHS, de não existir celular e muito menos CTRL C + CTRL V na hora de fazer trabalho de escola. Uns curtiram, se interessaram, outros se acharam malandros porque nasceram nesse tempo tecnológico e que a gente era mega babaca, rs.

Mas isso me fez pensar que poxa, eu só tenho 15, 16, anos a mais que eles e tenho certeza que os pais deles devem ter histórias muito mais interessantes que as minhas para contar, será que eles não conversam com os filhos? Será que eles abrem mão da -na minha opinião- melhor parte de ter um filho, que é ensinar, compartilhar?

A criança é uma esponja -fato, que absorve tudo que está em sua volta e os pais tem papel fundamental nesse oceano que permeia seu filho. A escola tem seu lugar, o professor tem seu lugar, o ambiente tem seu lugar, mas o pai é o que coloca pra dormir, conta história, apresenta o mundo e seus mistérios. A criança escuta seus pais, imita seus pais, os admira.

Mas não é só por causa da história bonitinha dos anos 80 e minha infância que resolvi escrever esse texto, e sim porque outro dia uma linda menina do alto dos seus 8 anos estava me falando da tragédia no Haiti, o que eu tinha achado, e perguntei se ela tinha ficado triste, ela disse que um pouco, mas que nem tinha chorado porque "eles não eram iguais a gente", como assim, eu perguntei, e ela disse: tia, eles não são iguais porque tem a pele mais escura que a gente. Expliquei para ela que todo mundo era igual, porque somos seres humanos e não importa a embalagem que tem por fora, por dentro somos os mesmos. Ela ouviu, ficou calada e logo mudou de assunto.

Eu me pergunto, os pais dela nunca conversaram sobre isso? Nunca ensinaram que somos irmãos, que devemos amar e respeitar o próximo e coisas tais? Pais, não abram mão dessa tarefa, é por isso que vocês tiveram filhos.